Foi Abel Viana, em 1946, que pela primeira vez publicou este pé de estátua couraçada, classificando-o como “pé votivo”, sem fornecer qualquer indicação sobre o local e o contexto de achado [VIANA, Abel, 1946].
Pé de estátua couraçada colossal de Pax Iulia, Beja
Séc. I d. C (meados)
Foto: M. Conceição Lopes@
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O “pé heróico”, como o designou Luís de Matos [MATOS; Luís, 1996], é um fragmento da parte dianteira de um pé direito, calçado com uma crepida ricamente decorada, deixando nua a extremidade do pé, conforme à tradição grega. Este pé, com 24 cm de comprimento (34, 5 com a base), assenta num soclo com c. 10 de altura. A decoração da crepida apresenta na parte superior as cordas entrecruzadas que apertam no tornozelo e, lateralmente, uma cuidada decoração compósita de semicírculos bordejando as cordas e um ramo de acanto decorado com roseta, palmetas e pétalas de lótus. Uma fita ajusta os dedos, os quais se apresentam bastante danificados, todavia, deixando perceber as marcas das falanges. Entre o halux e o segundo dedo passava a tira que fixava a sola, alta de 2 cm, à parte superior da crepida, como se percebe pelo pequeno vestígio que dela resta.
Em Conimbriga, foi identificado um fragmento de um pé esquerdo que Adília Alarcão considerou ter pertencido a estátua couraçada e colossal de um imperador, venerada no forum.
Havia em Pax Iulia edifícios importantes, como revelam as escavações recentes, e havia esculturas colossais que com eles se colocavam. Algumas inscrições, gravadas em pedestais de estátuas, conduzem-nos a templos, como aquele do culto a luventus ou Iuventas, que se localizava sobre o capitólio. Outras trazem-nos a lembrança de honras feitas a cidadãos, recordando uma delas que a população, por subscrição pública, tornou público o seu agradecimento a Gaio Júlio Pedão (IRCP, 239], duúnviro, flâmine dos divinos imperadores, por ter administrado bem a república e ter auxiliado com dinheiro.
Continuando com as inscrições que se recolheram no aglomerado urbano de Pax Iulia, e que José d'Encarnação tão sabiamente nos tornou legíveis, há, também, aquela, de enormes dimensões, que apresenta Gaio Júlio [IRCP, 233], que segundo uns é um magistrado, mais um, que terá distribuído benesses à população, a homens e mulheres e, que, de acordo com outros é um magistrado que pertenceu ou presidiu a uma das duas assembleias de notáveis, a dos cidadãos e a dos indígenas, que terão co-existido na cidade.
Num pedestal de estátua, nalguma zona nobre da cidade, o escravo Modestus imortalizou o edil M. Clódio Quadrado [IRCP, 237] e noutro inscreveram os libertos públicos a sua homenagem a Décimo Júlio Saturnino [IRCP, 240].
Caminhando um pouco mais pelas ruas e andado para a entrada das portas da cidade, lá onde repousam os morto, estava, em certo tempo, o tristíssimo epitáfio, em forma de poema, que os familiares dedicaram a Nice que viveu apenas 20 anos.
«Quem quer que tu sejas, viandante, que passares por mim, neste lugar sepultada,
se de mim tiveres pena — depois de teres lido que faleci no vigésimo ano de vida —
e se o meu descanso te sensibilizar, rogarei que, fatigado, tenhas mais doce descanso,
mais tempo vivas e longamente envelheças nesta vida que não me foi lícito desfrutar.
Chorar, de nada te serve. Porque não aproveitas os anos?
Ínaco e Io mandaram fazer para mim.
Vai, é preferível, apressa-te, agora que já leste o que tinhas para ler. Vai.
Nice viveu vinte anos».
Regressados ao forum, a praça principal da cidade, em algum dos edifícios públicos, no século I d.C, terá sido levantada a colossal estátua couraçada, muito certamente de um imperador, à qual pertenceu este pé.
Continuando com as inscrições que se recolheram no aglomerado urbano de Pax Iulia, e que José d'Encarnação tão sabiamente nos tornou legíveis, há, também, aquela, de enormes dimensões, que apresenta Gaio Júlio [IRCP, 233], que segundo uns é um magistrado, mais um, que terá distribuído benesses à população, a homens e mulheres e, que, de acordo com outros é um magistrado que pertenceu ou presidiu a uma das duas assembleias de notáveis, a dos cidadãos e a dos indígenas, que terão co-existido na cidade.
Num pedestal de estátua, nalguma zona nobre da cidade, o escravo Modestus imortalizou o edil M. Clódio Quadrado [IRCP, 237] e noutro inscreveram os libertos públicos a sua homenagem a Décimo Júlio Saturnino [IRCP, 240].
Caminhando um pouco mais pelas ruas e andado para a entrada das portas da cidade, lá onde repousam os morto, estava, em certo tempo, o tristíssimo epitáfio, em forma de poema, que os familiares dedicaram a Nice que viveu apenas 20 anos.
«Quem quer que tu sejas, viandante, que passares por mim, neste lugar sepultada,
se de mim tiveres pena — depois de teres lido que faleci no vigésimo ano de vida —
e se o meu descanso te sensibilizar, rogarei que, fatigado, tenhas mais doce descanso,
mais tempo vivas e longamente envelheças nesta vida que não me foi lícito desfrutar.
Chorar, de nada te serve. Porque não aproveitas os anos?
Ínaco e Io mandaram fazer para mim.
Vai, é preferível, apressa-te, agora que já leste o que tinhas para ler. Vai.
Nice viveu vinte anos».
Regressados ao forum, a praça principal da cidade, em algum dos edifícios públicos, no século I d.C, terá sido levantada a colossal estátua couraçada, muito certamente de um imperador, à qual pertenceu este pé.
Executado por um artista qualificado, que poderá ter trabalhado no programa iconográfico do centro monumental de Pax Iulia, talvez, em tempos de Cláudio, quando se davam os retoques finais do programa de reconfiguração da cidade iniciado um pouco antes por seu tio, o imperador Tibério, cujo templo de culto imperial se apresenta como obra notável no forum.
Nenhuma inscrição nos trouxe, até hoje, a certeza do local exacto de onde estava a estátua que, apoiada neste pé, pela sua altura, certamente observava toda a cidade. Mas, fixando-nos em tão extraordinária peça, são as palavras certas de Augusto que dela se propagam em silencioso eco pela cidade: Em tudo o que fizeres apressa-te lentamente.