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02/02/2018

As villae , a destruição, o estudo e o resto mais que se lhe aluga


A  agricultura monótona e intensiva que está a implementar-se no Alentejo está a alterar de modo dramático e a paisagem construída ao longo de milénios ,sobretudo nas terras profundas dos barros de Beja.

Originada há muitos séculos, a paisagem do território alentejano é a herança transmitida de um longo processo de transformação da epiderme da terra e a história de uma forma harmoniosa de relação do homem com o meio ambiente. Logo abaixo da superfície, assuando às vezes nas cores distintas do coberto vegetal, ou no olhar atento das fotografais aéreas, estão preservados os testemunhos daqueles que desde um tempo sem conta nos transmitiram os saberes de amanhar a terra e os poderes dos que cultivando se foram construindo em colectivo cultural.
 
Quem estuda a dinâmica dos campos e os sistemas agrários sabe que outras transformações houve; e nem precisamos de recuar muito no tempo para sabermos como foram dramáticos para a terra e suas gentes  certas formas de apropriação da terra. 

Hoje, assistimos a novas formas de exploração e de posse da terra. Neste novo tempo, os senhores da terra descartam essas heranças, ignorando o quanto elas são parte do nosso ser e tamanhos instrumentos do saber.
 
Reclamamos contra a destruição das materialidade antigas do mesmo modo que nos rejubilámos com a construção da barragem do Alqueva. Celebrámos modernidade quando a terra se esventrou para fazer passar condutas que sem apelo nem dó destruíram bem delineadas redes de regadio, onde condutas e poços serpenteavam pelos campos que na época romana e muçulmana eram irrigados. Novos acessos descartam os antigos percursos e as formas parcelares com origem antes dos romanos sucumbem sob os profundos rasgos que máquinas disformes abrem no chão.
 
O que hoje assistimos não é apenas a destruição de vestígios da antiguidade é, também, uma forma construída no tempo longo do homem se relacionar como seu meio ambiente, do homem dar corpo à sua cultura ancestral.
 
Por isso, é necessário lançar o alerta e reagir. É necessário protestar e exigir que as leis mudem.
A melhor forma de lutar é ter armas poderosas. Contra as máquinas o neoliberalisomos que o Alqueva abriu à exploração da terra, o  conhecimento é a nossa amei poderosa arma. Exigir que o conhecimento seja chamado a participar nas decisão sobre os projectos que mudam a superfície da terra, que aniquilam o palco onde a nossa cultura está em cena é uma luta maior.
O Alentejo tem testemunhos múltiplos para trazer para discussão. Das vilas romanas ao Couto de Serpa há toda um conjunto de vinculações  à terra que se podem convocar.
 
o mundo agrário da antiguidade é um mundo de interesse sem fim. Mas é preciso estudar muito para se perceber ; e trabalhar mais ainda para se conhecer.

Repito aqui , em modo breve, o que creio poder esclarecer sobre o sentido do termo villa:
 Para Tito Lívio (Hist.Rom., II, 62-3) e Tácito (Hist. V, 23, 15; IV, 67, 7; Ann., III, 46, 7), villa era qualquer tipo de residência dispersa pelo campo. Varrão (R.r., II, 2; III, 5), que nos introduz numa pormenorizada discussão sobre o significado de um termo genérico com múltiplas acepções, dá-nos uma melhor caracterização deste tipo de estabelecimentos. Contrariando a definição de Tito Lívio e Tácito, afirma que o facto de um edifício se situar fora da cidade não significa, necessariamente, que se trate de uma villa - nam quod extra urbem est aedificium nihilo magis ideo est villa (R.r III, 2). Seguidamente, acrescenta que, sem um fundus bem cultivado e de superfície importante, não existe villa - et quam villa non sit sine fundo magno, et eo polite cultura...(R.r III, 2).
Para Columela, a villa era composta por três partes: pars urbana, destinada à residência do proprietário, pars rustica, destinada a alojar os criados da lavoura e pars frumentaria, que era o conjunto dos edifícios destinados à transformação e reserva de produtos e recolha de animais (adega, celeiro, lagares, eira, estábulos, etc.). Na definição de Varrão, a pars urbana e a pars rustica de Columela são designadas por villa urbana e villa rustica, o que tem, em nosso entender, provocado alguns equívocos, pois tem servido para fundamentar diversas categorias tipológicas relacionadas com as villae 11.

O termo reveste-se de um grau importante de subjectividade e o conceito de villa tem sido aplicado de maneira indiscriminada aos sítios rurais da época romana.
Por villa entendemos um estabelecimento rural disperso à cabeça de um domínio
Caracterizamo-la como uma unidade de exploração agro-pastoril constituída por dois elementos indissociáveis: conjunto de edifícios habitacionais, de armazenamento, de transformação e estábulos e uma propriedade fundiária, contínua ou descontínua.
Devendo a villa ser entendida no indissociável binómio, edifícios e fundus, afigura-se-nos pouco razoável que se valorize superlativamente um dos elementos da composição e se classifiquem estes estabelecimentos com base em critérios que incidam apenas na configuração dos edifícios
Para Columela, a villa era composta por três partes: pars urbana, destinada à residência do proprietário, pars rustica, destinada a alojar os criados da lavoura e pars frumentaria, que era o conjunto dos edifícios destinados à transformação e reserva de produtos e recolha de animais (adega, celeiro, lagares, eira, estábulos, etc.). Na definição de Varrão, a pars urbana e a pars rustica de Columela são designadas por villa urbana e villa rustica, o que tem, em nosso entender, provocado alguns equívocos, pois tem servido para fundamentar diversas categorias tipológicas relacionadas com as villae 11.
O termo reveste-se de um grau importante de subjectividade e o conceito de villa tem sido aplicado de maneira indiscriminada aos sítios rurais da época romana.
Por villa entendemos um estabelecimento rural disperso à cabeça de um domínio
Caracterizamo-la como uma unidade de exploração agro-pastoril constituída por dois elementos indissociáveis: conjunto de edifícios habitacionais, de armazenamento, de transformação e estábulos e uma propriedade fundiária, contínua ou descontínua.
?Devendo a villa ser entendida no indissociável binómio, edifícios e fundus, afigura-se-nos pouco razoável que se valorize superlativamente um dos elementos da composição e se classifiquem estes estabelecimentos com base em critérios que incidam apenas na configuração dos edifícios. [M. C. Lopes / A cidade romana de Beja, pp. 223, 224 e 227].

Se invoco este tema aqui é porque me parece pouco acertado que nas denúncias que fazemos (justa e obrigatoriamente fazemos)  se privilegiem os edifícios e se esqueça o  fundus, porque este era  organizado de modo orgânico e engenhosamente marcado em relação com a sociedade agro-pastoril que o enquadrava. É porque se tem tendência a criar um campo cheio de edifícios agrícolas, pertença de senhores, mas vazio de  agricultores, isento da terra que cultivam e do modo como cultivam.
Os sistemas agrários e, conexamente os sistemas de regadio, fazem parte da villa, destrui-los, ignorá-los enferma do mesmo procedimento que apenas se preocupa em escavar  a parte urbana das villae e  a das cidades, em procurar os mosaicos, mas  ignora as casas rasas com chão de terra batida, em mostrar os cacos bonitos, os importados e os de grande qualidade técnica, mas ignora a cerâmica comum, remetendo-a para para o fundo dos contentores e limpando-a dos estudos; que  mostra (n)os cemitérios  materiais e inscrições mas que esquece que há necrópoles associadas às villae. Selecionar os documentos com que se constrói a história do homem, pela sua aparência, no caso do espaço agrário das sociedades antigas,  é retirar a um grupo imenso de indivíduos o direito à história.
A villa de fonte dos frades em foto de 1995, tinha um impressionante sistema de regadio cuja origem remontava longe e se perpetuou, mesmo com a campanha do trigo. Nada resta e, todavia, a água é o tema base da contemporaneidade.

O mesmo acontecia na villa da Cegonha, aqui ilustrada.

Porque o conhecimento é o nosso mais forte aliado, vale a pena fazer o esforço para nos informarmos.

Deixo aqui para consultar estas obras que muito nos podem ajudar.  

G. Chouquer, Les catégories de droit agraire à la fin du IIe s. av. J.-C., Ouvrage édité par l´Observatoire des formes du foncier dans le monde, FIEF (Ordre des Géomètres-Exper ts)  Paris, décembre 2016
https://ager.hypotheses.org/1330

G. Chouquer, La Terre Dans Le Monde Romain.Anthropologie, droit, géographie
https://digitalis.uc.pt/ptpt/livro/la_terre_dans_le_monde_romain_anthropologie_droit_géographie














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17/08/2017

ESCAVAÇÕES NA RUA DA MOEDA/RUA DOS ESCUDEIROS — BEJA

 ESCAVAÇÕES NA RUA DA MOEDA/RUA DOS ESCUDEIROS — BEJA

DE 28 DE AGOSTO A 1 DE SETEMBRO


Retomaremos as escavações no Logradouro do edifício do futuro Centro de Arqueologia em Beja

Será uma campanha de escavações com uma duração curta dado que se objectiva exclusivamente escavar contextos selados, necessários para resolver algumas questões relacionadas com a precisão cronológico dos edifícios do forum romano e a conformação temporal detalhada tanto quanto for possível dentro dos quadros já determinados. A escavação do corte aqui representado (e na planta localizado), neste contexto, constitui uma prioridade; pretende-se verificar se é possível ainda determinar com maior exactidão os momentos das intervenções no templo de Augusto.
          É, como se pode verificar, um corte com mais e 2,5 metros de profundidade e será escavado em 7 metros de altura.
Trata-se de arqueologia no quadro do projecto científico Arqueologia das Cidades de Beja. 

Contamos com o apoio da Câmara Municipal de Beja.

Á semelhança dos outros anos acolhemos jovens estudantes da cidade que queiram voluntariamente participar. 

inscrições em: arqueologiadascidadesdeBeja@sapo.pt

20/07/2017

Arqueologia do Concelho de Serpa / 20 anos depois.


Há 20 anos, em 1997 publicava-se a obra que haveria de apresentar, de modo interpretado, os dados arqueológicos revelados na superfície da terra do concelho de Serpa.

"A carta Arqueológica de Serpa nasceu de uma proposta da Câmara Municipal a um dos autores quando este se dirigiu à entidade solicitando apoio para trabalho de prospecção no concelho, tendente integrar esse estudo num mais abrangente sobre o território de Pax Iulia".

O autor era Maria da conceição Lopes e o autarca João Rocha, actual presidente de Câmara de Beja.

Os apoios para o trabalho de campo permitiram percorrer todo o espaço do concelho e para nele participar para a contratação de Pedro Carvalho e Sofia Gomes.

"A importância dos dados recolhidos, quer por si mesmos, quer pelo conjunto, tornaram evidente que não era legítimo qua apenas se elaborasse um catálogo de sítios e achados do concelho, cuja tradução, enquanto instrumento de trabalho, serviria especialistas interessados na arqueologia da região e a autarquia enquanto gestora dos seus bens arqueológicos".

A Arqueologia do Concelho de Serpa haveria, por isso, de reunir especialistas de várias arqueologias para colaborar na publicação dos dados Jorge Alarcão, José de Encarnação, Raquel Vilaça e Helena Catarino.

A Arqueologia do Concelho de Serpa é, ainda hoje, uma marca importante no registo e divulgação arqueológica de qualidade. Uma ferramenta de trabalho, certamente desactualizada no que respeita ao número de sítios, sobretudo pelos trabalhos de Alqueva (para os quais foi profunda e globalmente usada, refletindo bem o carácter público desta investigação) mas, ainda assim, absolutamente actual pelo método de recolha, modo de registo e qualidade de divulgação.

Feita num tempo em que os computadores eram objectos de luxo, a revelação de fotos caríssima, a qualidade gráfica e ilustrações da obra marcam, também elas, a diferença relativamente ao que então se fazia.

A Arqueologia e a sua importância social, ou a transferência para a comunidade, como hoje se diz, não é para nós, uma moda ou uma postura de interesse, está bem claramente refletida nesta obra, quando disso se não falava.
" ...a nossa intenção e a da autarquia foram coincidentes. Deveria ser preparado um trabalho que satisfizesse simultaneamente os interesses da comunidade científica, da autarquia e da comunidade em geral . Isto é, sem perder o rigor científico, era necessário disponibilizar, sob forma de publicação uma visão do concelho e da sua arqueologia".

"Percorrido o campo, registadas as memórias, proposta a realidade possível dos homens de outros tempos, alguns dos quais conhecemos pelo nome, imortalizado nos seus epitáfios ou no de algum dos seus, ou nos votos que fizeram aos deuses, eis oq eu, sob a form de livro, devolvemos, aos homens de hoje e ao concelho de Serpa"


Retemos sempre o que  escreveu o Professor Jorge de Alarcão na página de apresentação


A villa branca de Serpa, tão cheia de Luz, tem escuro o seu passado.... Em cinco. meses de trabalho de campo , Pedro Carvalho e Sofia Gomes, sob orientação de M. Conceição Lopes, identificaram três centenas de moradas que o delgado chão alentejano mal oculta e todavia jazem deslembradas. ... Não terão visto tudo. Mas quem pode pretender ter feito uma inventário exaustivo do património Arqueológico? Sempre um pastor, um lavrador , um caçador que são homens mais chegados à terra, descobrirão novos lugares, denunciados por talhões ou por escórias, por louças estilhaçadas ou moedas.

              Fica feito o inventário , que anuncia muitos lugares de interesse: dormiam quase todos na quietude de um esquecimento do qual esta obra agora os faz sair."









16/07/2017

A civitas de Pax Iulia: percursos e debates...


Exactamente há dezassete anos, em 16 de Julho de 2000, entreguava-se nos  serviços académicos da UC a dissertação de doutoramento intitulada “A Cidade Romana de Beja , percursos e debates acerca da “civitas” de PAX IULIA” para que seguisse o processo tendente a ser defendida em provas públicas na Universidade de Coimbra.

Em 15 de dezembro de 2000 foi o doutoramento concluído com a aprovação com louvor e distinção por unanimidade.
Nessa atura ousou-se  entregar dois volumes em papel e os restantes sete em CD. Nunca ninguém tinha entregue na FLUC as dissertações de doutoramento ou mestrado em formato digital e o desencadear do processo obrigou a um conjunto de diligências tendentes a confirmar essa possibilidade. Foi aceite e abriu precedente.

Este era o segundo trabalho sobre a cidade de Pax Iulia.



Em 1992, em Fevereiro, apresentei para prova de avaliação científica o trabalho “ A sigillata de represas. Tratamento Informático” .

Pela primeira vez  no mundo, apresentava-se uma base de dados para conjuntos de cerâmica romana. Eram 32 .000 peças provenientes da villa romana de Represas da colecção de Fernando Nunes Ribeiro. A villa foi destruído e, a meu saber, além de uma carta de repulsa pela destruição e de protesto pelo comportamento das instituições que tutelam a arqueologia, não conheço outras preocupação. 
Era uma villa romana absolutamente fantástica  e diferente de todas as outras, pois era um entreposto comercial, onde, inclusive, se reconheciam vestígios da centurião romana. Havia um estudo continuado desta villa e sabíamos muito do subsolo porque além da fotografia aérea, em 1990, gastámos 250 euros para, pela primeira vez em Portugal, se usar prospecção geofísica aplicada à arqueologia.
Do primeiro livro, a utilidade pode medir-se, por exemplo, pela quantidade de vezes que se refere na bibliografia dos trabalhos do Alqueva e a qualidade e importância pelas referências nacionais e internacionais  O trabalho de campo, que deu origem a uma carta arqueológica ,  o qual constitui o segundo volume da tese, foi feito com um projecto da FCT, dinheiro próprio e o apoio do Presidente da Câmara de Serpa, João Rocha, para a Carta Arqueológica de Serpa e o do saudoso Presidente de Câmara de Vidigueira, Carlos Pinto Goes, para a Carta Arqueológica de Vidigueira.

Da Câmara de Beja recebi 200 euros para ajudar a pagar a publicação que se fez em 2003, a troco de 500 livros. 

Não s sabe onde estarão esses livros. Foram levado  para a Biblioteca José Saramago e nunca mais ninguém soube qual o destino que lhe foi dado. 
Como nesse ano fiz um grande protesto, que chegou aos jornais e televisão, (veja-se post anterior)  contra o que se passava na Praça da República, talvez os livros tenham desaparecido no ruído do meu protesto.

Hoje, dia 16 de Julho de 2017, termino um livro sobre a escultura romana de Pax Iulia. Haverão de faltar exemplares que estarão algures por publicar — hoje já se não faz o que Abel Viana fazia e torna-se difícil fazer trabalhos de síntese (e, sobre o método de Abel Viana falarei um dia destes). Haverá, certamente, quem se apresse a tomar como mais importante esse facto  que a importância dos que se reuniram e estudaram. 
Brevemente teremos publicação, com meios próprios e com a ajuda de amigos que fazem o design, com o apoio de muitos especialistas e outros amigos. 
Quando  iniciei este livro pensava que este era o início de uma nova fase de trabalhos sobre Pax Iulia. Hoje, 25 anos depois do primeiro, realizei  que que pensava...  
Lutar tanto também cansa!

27/11/2016

Os achados arqueológicos na Praça da República em Beja ou a "Falta de verbas impede investigação de importantes achados arqueológicos em Beja" de 2003

em 13/06/2003, Carlos Dias, escrevia no jornal o Público


Importantes achados arqueológicos encontrados nas remodelações da Praça da República de Beja vão voltar a ser enterrados por falta de verbas para levar a cabo uma escavação.No subsolo da praça surgiram pequenas peças quadrangulares de mosaico (tesselas) incrustadas em pavimentos antigos muito bem preservados. A arqueóloga Conceição Lopes, que há mais de uma década realiza trabalhos de investigação sobre o período romano no centro histórico de Beja, observou-os e concluiu "que são muito importantes pelos indícios que revelam ". "Talvez sejam da época romana e de edifícios eventualmente adjacentes ao fórum" - conjunto de edifícios públicos que constituem a zona central da cidade - que se pensa poder ter existido naquele local, presume, por seu turno, a arqueóloga responsável pelo levantamento e registo da área prospectada, Adelaide Pinto.No entanto, os trabalhos de escavação necessários para uma melhor interpretação do material agora posto a descoberto "não vão ser possíveis", explica Adelaide Pinto, que vai apenas "limpar, fotografar e registar" os achados. Os vestígios serão outra vez enterrados, depois de revestidos com uma tela de geotêxtil sobre a qual será aplicada uma camada de areia. Por cima ficará a praça, cujo actual pavimento irá ser substituído por outro de lajes de mármore, no âmbito do programa de requalificação urbana Polis. O presidente do Instituto Português de Arqueologia (IPA), Fernando Real, explica que não se procederá a escavações por falta de dinheiro: "Só estamos a intervir na medida do estritamente necessário, um trabalho do género custa dinheiro e vivemos numa fase de contenção orçamental". Mas razões de outro género estão também na base da decisão do organismo que tutela a arqueologia em Portugal: uma intervenção mais profunda "só é possível desde que esteja planificada, o que não é o caso", defende Fernando Real. O presidente do IPA refuta a possibilidade de se efectuarem escavações enquanto a obra durar, alegando que "os calendários das duas intervenções poderiam não coincidir", arrastando assim os trabalhos de remodelação da praça. Este responsável mostra-se preocupado não só com as finanças do IPA como com as do Estado:"Não é lícito cobrar ao promotor da obra os custos das escavações". Para os vindouros, diz, fica "uma reserva arqueológica", em condições de no futuro poder ser estudada. Basta apenas remover algumas das placas de mármore que vão constituir o piso da praça. Fernando Real confirma a importância dos achados, nos quais são visíveis estragos provocados por obras anteriores, a partir dos anos 40 do século passado. O "contentamento de algumas pessoas", sobretudo arqueólogos, perante a descoberta terá motivado "este sururu em torno da obra, para que se fosse mais longe na investigação". A arqueóloga Conceição Lopes que considera "inacreditável que as pesquisas fiquem apenas ao nível da limpeza das estruturas descobertas". Uma intervenção como a que está a ser efectuada "no local onde se encontra a acrópole de Beja devia ir muito mais longe, para aprofundar as investigações", reclama. A arqueóloga esclarece que todos os levantamentos que já fez na área envolvente da praça a levam a concluir "que existe um centro monumental onde pode estar localizado o forum romano": a Praça da República e áreas vizinhas. Mas acrescenta que o interesse arqueológico não se deve circunscrever apenas à época romana. "Existe [no subsolo] informação importante da evolução de Beja nos períodos islâmico, medieval e moderno", assinala, considerando necessário elaborar um projecto científico para se conhecer com mais precisão "o estatuto de uma cidade que foi a única colónia romana no sudoeste peninsular". 
"Não é lícito cobrar ao promotor da obra [o Estado] os custos das escavações". Afirmava o zeloso Fernando Real Presidente do Instituto Português de Arqueologia.
Passados 13 anos continuamos a considerar "inacreditável que as pesquisas fiquem apenas ao nível da limpeza das estruturas descobertas e quanto mais conhecemos de Beja, mais inacreditável achamos que assim se tenha procedido. ". 
Não sendo lícito cobrar ao promotor da obra (que foi o Estado) os custos da escavação, como afirmou  Fernando Real, seria lícito (porque a lei o exige) que o Estado reclamasse a todos os arqueólogos sem excepção (nem mesmo para as empresas privadas)  os resultados das escavações que fazem. Até hoje, passados 16 anos, não há relatório final da escavação (ou então estará inacessível ou indisponível) e tanto quanto sei ler , a lei obriga a que tivesse sido apresentado há muito.

entre outros achados o do mosaico é muito importante ; é cada vez mais mais importante. É que, face aos achados recentes na área do fórum, este elemento, que deverá ser comparado com outros , entre eles o da cela do templo de Tarraco (imagem supra apresentada), parece ganhar sentido . Tanto quanto me lembro, o mosaico escavado era muito semelhante. Esperamos com esta publicação dar mais um estímulo para que o Relatório seja apresentado e o mosaico estudado. Ou não é nestes casos que faz sentido falar do que é que é licito ou não é licito?

06/10/2016

Sobre o templo Romano de Pax Iulia: retomando Abel Viana

Planta publicada por Abel Viana, Rev. Museu I, Fig 1
"No início de 1939 iniciou-se em Beja a construção de um novo reservatório para abastecimento de água, em substituição do que mal inspiradamente se fizera por cima da profanada igreja quinhentista da Misericórdia. Em Outubro do mesmo ano fui convidado a examinar as profundas valas abertas para caboucos porque, facto absolutamente inesperado, a vasta escavação patenteara fortíssimo alicerce de edifício antigo  cujo estudo se tornava conveniente."
..."Como disse , as fundações do templo  foram descobertas ao abrirem-se os caboucos para o novo depósito de água. Quer por razões de ordem técnica quer pelo desejo de não os destruir, ou de não os ocultar ainda mais pela nova e pesada construção, resolveu-se fazer o depósito um pouco desviado, no ponto marcado pelo n.º2"

Planta de estruturas romanas

"O estudo e conservação destes restos agora aparecidos na Praça da República, assim como a entrega no Museu, da cerâmica recolhida no curso das obras do depósito, foram iniciativa do presidente da Câmara Municipal de Beja, SR. Dr. Leonel Pedro Banha da Silva, a quem os monumentos arqueológicos , históricos e artísticos desta cidade devem a melhor e mais eficiente lei municipal de protecção e valorização , até hoje sem igual em qualquer parte do País." Abel Viana ,  Revista Museu I, Beja, Outubro de 1942.


28/12/2015

Beja 1942. Proposta sobre Património Arqueológico, Histórico e Artístico do Concelho de Beja

Em 1944, no primeiro volume da Revista Arquivo de Beja, publica-se o regulamento que rege a protecção do Património Arqueológico, Histórico e Artístico do Concelho de Beja. A proposta, apresentada à sessão  de Câmara pelo Presidente do Município, Dr. Leonel Pedro Banha da Silva, no dia 21 de Agosto de 1942, foi aprovada e, de imediato, entrou em vigor.
A visão estratégica que se lê nesta proposta, cuja característica definidora é a simplicidade de abordagem ao património, confere-lhe um grau de profunda actualidade.
O considerando de “que esses documentos [edifícios monumentais e todos os documentos arqueológicos e artísticos], além de preciosos elementos de estudo e de progresso local , constituem parte integrante do nosso património espiritual que nos cumpre conservar e defender”, dispensa qualquer esclarecimento sobre elaboradas distinções entre património material e imaterial, espírito do lugar e outros conceitos que tomaram de assalto a escrita do Património, deixando transparente a obrigação de dele se cuidar.
A ideia de integridade territorial perpassa pelos seis considerandos que sustentam a proposta. O território é uma unidade e é como Unidade que se prevê a sua abordagem.
No articulado da Proposta, nomeadamente, na criação da Comissão encarregada de proceder ao arrolamento em todo o concelho “de todos os elementos monumentais, arqueológicos e artísticos”, fica clara que a visão de uma análise à escala alargada, no caso a da jurisdição administrativa possível, é aquela que mais enquadra os propósitos de preservação e divulgação; e, clara é, também, a condição de que a análise se deve confiar a quem detém o conhecimento.
Relativamente às actuais visões sobre o património, as quais se regem por cadernos de encargos que autorizam intervenções avulso e pontuais de técnicos sem qualquer especialização, ou por legislação que pactua com intervenções que garantem a designada preservação pelo registo, esta Proposta é bastante mais sábia e evoluída.
 Mesmo admitindo os propósitos ideológicos inerentes a uma proposta desta natureza no ano de 1942.
Reproduz-se aqui a Proposta, simples e pragmática,  para que nos deixe espaço para reflectir