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21/10/2010

Os amores melhores são os amores da rua

Era uma vez uma academia onde, diz-se, se ingressa para aprender.
Era uma vez o ensino que, diz-se, se criou para implementar conhecimento.
Era uma vez o tempo presente onde a academia é um caixote fora de prazo em que quem ensina não tem espaço e quem aprende sofre de claustrofobia. Sai correndo procurando outros amores, daqueles
que nalguma parede do bunker estão definidos, exibidos, exaltados como
Os amores melhores
são os amores da Rua.
Da academia só nos dias de desbunda, quando os amores se aquentam escondidos numa capa preta
solta pela rua se pode pensar que nela se ingressa para o que quer que seja.

11/10/2010

Archeology Of Homelessness

 Eu tinha a certeza que ainda havia Arqueologia para lá dos bibelots.
Se em Portugal eles já a impestaram, no mundo vão aparecendo exemplos de que eles nunca terão  condição para a matar. Eles jamais terão competência para  perceber  No matter what you see in the movies, archaeology isn't really about finding ancient temples or golden idols. It's about the day-to-day "stuff"— the material culture—of people's lives. It doesn't even have to be ancient, as a study of homeless peoples' stuff in Indianapolis is showing. Instead of being an exotic field, archaeology may even help the homeless to live better lives.
http://www.sciencedaily.com/releases/2008/11/081124130956.htm
Sejam lá o que forem os Homeless; Afinal vale  a pena fazer Arqueologia

09/10/2010

Arqueólogos bibelots


Cada vez que vejo obras na estrada ou na rua e um jovem com o ar mais enfadado do mundo abrando. Abrando a velocidade do carro ou o ritmo do passo. Abrando, porque sei que, a cada vez, me vou surpreender com o que vejo. Cada vez  o cenário ilustra com mais vigor o  caminho de degradação em que a Arqueologia portuguesa se movimenta.
Um dia destes, logo cedo, abrandei para poder observar com atenção e confirmar que era verdade o que me parecia ver; uma menina, cujo ar triste e a vergonha se não viam no rosto porque o ar de seca lhe tolhia os músculos faciais; olhava de modo quase envergonhado para uma escavadora que muito lentamente arrastava o balde para limpar a superfície das bermas da estrada.
Não sei explicar porque abrandei ao ponto de quase parar.  Apesar de saber que nestas situações abrando; talvez porque goste me indignar com o que vejo para seguidamente o divulgar como prova da necessidade que temos de criar um movimento de indignados contra esta caricaturização da Arqueologia.  Num destes dias, contava a história da menina  e do balde de escavadora em limpezas de fim verão na berma da estrada quando foi fui interrompida por uma colega que me disse: estás a falar das arqueólogas bibelot? Aqueles que impedem os desgraçados dos trolhas de dizer palavrões porque estão sempre ali como se fossem guardas prisionais!
Nem queria acreditar. Estava tudo dito. Nenhum discurso que eu ali fizesse teria o efeito daquela designação.
Bibelots. É isso mesmo! Não serão tão interessantes como os bibelots vendidos em http://www.bibelots.com.br/, que nos são apresentados  como "Mimos para si  e para os seus queridos"  mas posso acreditar  que seriam mais úteis nos locais onde se deslocam se se equipassem com alguns  dos adereços que aqui se podem comprar.
Talvez os trolhas os respeitassem mais. E, palavrões à parte,  os arqueólogos Bibelot dariam mais colorido à  Arqueologia, já que dar-lhe credibilidade não é o seu papel, contribuindo para a fazer sair deste momento de negritude.
Quando as leis são fruto de interesses de lobbys  é nisto que podem dar: Bibelots a assistir a obras. É Obra!

29/09/2010

Os professores PEC e as aulas que não são

Houve um tempo em que se falava dos professores Turbo. Eram os que se deslocavam a muitas universidades, dispersas pelo país, debitar a mesma coisa e ganhar muito dinheiro.
Hoje os professores Turbo são aqueles que são obrigados a dar muitas cadeiras, com muitos alunos em cada turma (a fazer avaliação continua!???) e sem tempo para se deslocar.
Estes professores Turbo do P(resentes)E(nquanto)C (onseguem) distinguem-se dos outros porque ganham pouco e moram numa Universidade; assemelham-se aos outros porque dão muitas aulas sem tempo entre umas  e outras, isto é, dão aulas que não  o são.

19/09/2010

Acesso à Universidade ou a vida a andar para trás


Acabei de tomar consciência de que a qualidade de vida da minha vida, foi aprisionada pela obrigação do sistema público de prestação de serviços a todos.
As vagas disponíveis na Universidade de Coimbra para a licenciatura de Arqueologia e História foram todas preenchidas. Se se repetir o que se vem passando nos últimos anos, aos 25 alunos que entraram por via da candidatura, irão somar-se mais uns tantos que mudam de curso, mais outros muitos dos contingentes especiais, mais os aposentados que por se julgarem, ou serem de facto, ainda jovens vêm embebedar o tempo livre caminhando para os bancos (podres e desconfortáveis) da Universidade e mais outros que não se sabe de onde vêm, mas sempre aparecem.
Ora, estas legiões de alunos (logo veremos quanto são estudantes), a quem a Instituição agradece, pois que nestes tempos de vacas magras para o Ensino Superior cada um representa uma propina e a propina “é um bem para se guardar”, são a razão para eu ver a minha vida a andar para trás e, maldito contra-senso, a minha vida anda para trás, mas é o desgaste que anda para a frente.
Com tantos alunos que todos os anos fazem a matrícula em História e Arqueologia, que ás vezes nem cabem nas fantásticas salas que nos dão para dar aulas, e um número tão curto de professores que a Instituição disponibiliza para esta licenciatura (5 dos quais 4 são Auxiliares e 1 Associado, uns conferencistas, para substituírem professores e dois contratados, um a 20% e outro a 50%), que são os mesmos que asseguram o 2º Ciclo em Arqueologia e Território e o 3º Ciclo em Arqueologia, é caso para perguntar se isto é ensino superior e/ou que poção mágica tomam estes professores.
É verdade que uma licenciatura com um nome destes nem devia ser permitida, quanto mais ter professores ou ser aberta a alunos. Mas já que existe e que tem público, deveria a instituição cuidar melhor do serviço que presta; é que se não fossem os docentes a trabalhar muito para lá dos limites, num imensurável esforço, assegurando um número impossível de cadeiras, ela morria por falta de condições.
Por ser tão absolutamente obscena a “ginástica” a que o corpo docente é obrigado, deveria ser solicitada a presença da ASAI no local de trabalho para averiguar as condições higiénicas em que funciona este serviço público, e a de outras entidades que atestassem as condições de segurança e dignidade no trabalho. De professores e alunos.
Mas que interessa a minha opinião expressa ou o que penso. O que importa é que o serviço se preste, se presta ou não presta, isso é irrelevante, contando que se cumpram os parâmetros es preste o serviço em condições.
Falando apenas de Ensino, pois não é aqui lugar para falar dessa perversidade chamada investigação, num ano lectivo lecciono seis (seis, repito) cadeiras obrigatórias, cada uma de sua área e sempre excedendo o máximo de horas que a lei determina (mas sem qualquer pagamento de horas extraordinárias). Frequentemente, algumas das cadeiras que dou num ano, no ano seguinte já não sou eu que as dou. Com um mês de férias, que já nem o direito a gozar os dias úteis legais de férias nos são dados, no qual temos que fazer escavações, o tempo para preparar aulas é eterno. Não, não é eterno, é infinito— nunca se alcança..
Eventualmente, deveria sentir-me importante, pois  deveria reconhecer que a Instituição está atenta à minha excelsa competência e à minha inesgotável capacidade de saber de tudo.
Por exemplo, a Instituição dá-me a responsabilidade de assegurar cadeiras de todo o tipo e temática, do 1º, 2º e 3º Ciclos, alternando os temas ao longo do tempo, sinto que já não tenho condições de assegurar com dignidade o serviço que me distribuem.
E não será qualquer um que pode assegurar três cadeiras das cinco do plano curricular do 1º semestre do 1ª ano do 1º ciclo. Não esqueçamos que, se acabadinhos de chegar à Universidade, os alunos apanham o mesmo professor segunda feira pela manhã a falar de História de Roma, segunda feira à tarde a introduzi-los na Introdução à Arqueologia e terça feira pela manhã a percorrer, à pressa, que num semestre nem tempo há para falar de Péricles, a História da Grécia. Ora, tanta coisa só mesmo um professor competentissimo. Não vão eles querer mudar o local de pagamento de propinas.
Ora, desgraçadamente, nunca senti outra coisa que não fosse uma identificação com a minha professora Primária, que pela manhã mostrava as sua habilidades em Português, à tarde nos ensinava Aritmética e no dia seguinte nos iniciava em lavoures e trabalhos manuais. Só me faltava a bata branca!
Mas mesmo assim, devia deixar o meu mau feitio de lado, e, fazer o esforço por me  sentir honrada por ser, eventualmente, um exemplo de que a Universidade está atentíssima aos seus melhores recursos, e que os coloca à disposição para formar alunos de excelência. A prova é que  boa parte dos alunos, sem nunca se queixar, assistiu voluntariamente a todas as aulas. Bravos alunos!
Eventualmente, deveria sentir-me deslumbrada. Mas como sou lúcida e tenho muito bem apreendido que mesmo sendo excepcional, ninguém pode ser eternamente bom e bom a cada dia, se não tiver espaço e tempo para refrescar o conhecimento, não sei o sentir, se algum coisa há para sentir. a este respeito. Imagino que os meus colegas também tenham muitas dúvidas em saber qual o seu sentimento face à situação em que nos encontramos. Exaustos, sem perspectivas de mudança é, ao invés de qualquer endeusamento, um sentimento confuso em que humilhação e vergonha fazem parte dos ingredientes do preparado aquilo que em ocorre sentir.
Depois, como tenho certo que sou apenas humana e partilho a excelência e as fraquezas de cada um de todos os humanos é a sensação de sentir que alguém colocou um lugar de inversão de marcha no meu percurso, contrariando a direcção que eu acho dever seguir.
Como se alguém me obrigasse  a seguir um  percurso no qual eu não me sei reconhecer.